MARCO REGULATÓRIO DAS GUARDAS MUNICIPAIS – II
Autor: Prof. João Alexandre Santos
PRIMEIRA PARTE – INTRODUÇÃO
“O QUE DE FATO PRECISA SER REGULADO PARA
QUE AS GUARDAS MUNICIPAIS CONSIGAM ALCANÇAR SUA INDEPENDÊNCIA INSTITUCIONAL?.”
É inegável que as legislações referentes aos assuntos ligados à
segurança pública são por demais esparsas. Apenas aqueles que se debruçam sobre
o tema, como é o seu caso estudioso leitor, é que conseguirão através de um
processo reflexivo e de acurada hermenêutica e exegese fazer as devidas
conexões que conduzam a uma interpretação lógica, razoável e possivelmente aplicável
ao caso concreto. Se analisarmos friamente a letra da lei, verificaremos que já
decorridos 24 anos da promulgação de nossa Carta Magna, somente o conhecido e já,
em partes, ultrapassado art. 144 da CF/88 é que indica a fórmula
jurídica e aponta os caminhos para transformar o esqueleto normativo
constitucional e os citados órgãos de segurança pública, naquilo
que a sociedade precisa urgentemente ver em prática. Precisa-se urgentemente da
conclusão do projeto do legislador constituinte, ou seja, juntar os órgãos,
verificar as suas conectividades e fazê-los trabalhar de forma harmônica e
interdependente.
Assim sendo, podemos dizer que temos de fato e de direito um corpo
nessa história. Órgãos sozinhos não formam um corpo. Precisamos sim da
existência desse corpo ou sistema[1].
O legislador constituinte conseguiu prever que só nominar os órgãos de
segurança pública, não traria a necessária eficiência à complexa arquitetura do
sistema de segurança pública por ele projetado. Por isso, deixou explicita uma ordem de serviço escrita para que o
legislador infra constitucional, legislasse objetivamente sobre as questões
pertinentes à organização e ao funcionamento dos citados órgão. Essa
ordem, materializada no texto do §7º do citado artigo, até hoje carece de
aprofundamentos e construção jurídica sistêmica, visando dar aos órgãos da
segurança pública a devida eficiência.
Prova de que não há um sistema pensado, foram as dificuldades surgidas
para as Guardas Municipais com o sistema INFOSEG
e o próprio Estatuto do Desarmamento,
que se arrastam até hoje, o qual será objeto de outro artigo. Muitas das
instituições municipais de segurança, mesmo após o convênio assinado,
possibilitando o acesso à senha, esbarraram em critérios menores de
interpretações e inclusive em ações discricionários de certas autoridades.
Particularmente no Estado de São Paulo, se não fosse pela pró-atividade do atual
Comandante da GCM de Embu Guaçu Eduardo Leite Barbosa e do dedicado Delegado de
Polícia Dr. Heleno Dell Oso Prado, do DIPOL da Polícia Civil de São Paulo, a
coisa estaria parada. Apenas a edição da Portaria DIPOL nº 01 de 16/06/2011, proporcionou
de maneira mais facilitada o acesso para obtenção da necessária senha para operar
esse valioso programa. Graças a esse servidor, comprometido não consigo, mas
com o sistema, é que o Comandante Eduardo pode conduzir os demais Comandante de
cidades, como Osasco, Santana de Parnaíba, Itapeví e demais, para que adotasse
as cautelas de estilo para obtenção das senhas e passassem a operar o sistema
INFOSEG. Como podemos falar em sistema,
se não passarmos por questões simples como conectividade de dados, informações
e ações?
Nessa esteira e assim pensando, já temos então o esqueleto, os órgãos,
o cérebro
(hoje representado pela SENASP),
falta agora a vital e necessária harmonia política, administrativa e
operacional dos órgãos previstos no art. 144 para que a coisa aconteça de fato.
Cumpre observar, que as Guardas Municipais, já fazem parte do dito sistema,
pois já foram previstas pelo legislador no §8º. Ocorre que o vírus do
corporativismo, da reserva de mercado em segurança pública, do descaso do
Congresso e das Câmaras Municipais com os assuntos ligados à pasta, pelo
estelionato legislativo que são as malfadadas PECs, pelo abandono nacional
representativo em que se encontram e pela inversão de prioridades esse corpo
que possui todas as possibilidades de ser atlético, robusto e eficiente, está
ficou tetraplégico, dependente de remédios caros e vive se arrastando às custas
de favores de um ou de outro para superar pequenos obstáculos. De gigante a
deficiente, de atlético a paralitico. Essa é a gestão dos assuntos de segurança
pública de nosso País. Evidentemente volto a frisar que alguns avanços se
fizeram presentes de 10 anos para cá. Mas pelo que vejo agora, a centralização
desmedida, a liberação de verbas por critérios políticos e não somente
técnicos, o crescente contingenciamento e a hipocrisia dominante, novamente
tiram o carro da segurança pública da faixa expressa, empurram-no para a faixa
da direita, onde de 5ª marcha, volta a andar em 2ª.
Essa introdução foi apenas para mostrar-lhe, que apesar das
dificuldades jurídicas, os demais órgãos, estão se saindo bem. As polícias
federais e estaduais de alguma forma possuem um modelo representativo
(associações, sindicatos, federações e conselhos) que são eficientes, eficazes
e que sabem defender os interesses políticos e legais de suas categorias, lá
onde a coisa deve ser gestada (Brasília). Fato que ainda não é uma marca no
seguimento de Guardas Municipais[2]
em razão da própria vaidade de algumas lideranças que mais buscam para si do
que para a categoria. O que de fato uma regulamentação para as Guardas
Municipais deve se preocupar em apresentar e defender? Quais são as prioridades
e sofrimentos desses valorosos profissionais, abandonados à própria sorte desde
1988? O que de fato eles precisam enquanto pessoas humanas que são? E o que a
instituição Guarda Municipal (Pessoa Jurídica de Direito Público) precisa para
se estruturar nesse sistema de segurança pública?
Uma coisa digo-lhes prezados leitores, isso baseado não só na teoria do
estudo acadêmico, mas no fato de já ter percorrido alguns Estados-membros de
nossa Federação e conversado com lideranças realmente comprometidas e com a
base. Não é preocupação do seguimento a cor que será seu uniforme, o modelo de suas
divisas, a quantidade mínima de seu efetivo ou se virá a fazer segurança urbana,
policiamento de posturas ou ainda colaborar supletivamente na segurança pública.
Preocupados estão, com processos de valorização profissional, que se limitou a
ficar no papel com a publicação da Portaria Interministerial nº 1; que bem poderia
ser amarrada aos requisitos a ser
preenchidos quando da intenção de obtenção por parte do município, recursos
federais para a segurança e ainda não foram. Preocupados estão, com um rol de direitos
mínimos que consiga fazer com que a jornada profissional ao longo de sua
trajetória seja motivadora e garanta minimamente uma carreira.
Então, apenas para reflexão, enumerarei aqui o que o cérebro (SENASP)
poderia incorporar as propostas de um marco regulatório, que caso venha a ser
aprovado, em muito ajudará, tanto ao servidor público guarda municipal como
garantirá a solidez jurídica e institucional que o órgão Guarda Municipal
precisará para contribuir para o bom e harmônico funcionamento do sistema de
proteção da sociedade Obviamente que as reflexões aqui trazidas são de cunho
pessoal estão sujeitas às críticas de nossos alunos, amigos e demais
profissionais. No próximo artigo detalharemos os quesitos complementares.
[1]
Para efeito desse artigo, usarei a palavra corpo como sinônimo de sistema.
[2]
Evidentemente não é uma fala genérica, há casos de excelência localizadas como
presenciei no Estado da Bahia, Rio de Janeiro, Maranhão e Paraná entre outros,
cujo processo baseado no esforço da liderança local, mesmo após perseguições
políticas e corporativas tem trazido conquistas louváveis, a mas que poderiam
ter sido amortecidas por uma regulamentação que poupasse esse embate regional
tão desnecessário.
PROF. JOÃO ALEXANDRE – Professor, Pesquisador e Especialista
em Políticas Públicas de Segurança, Direitos Humanos e Ciências
Policiais. Coordenador Acadêmico do Centro de Estudos em Segurança
Pública e Direitos Humanos – CESDH. Coordenador Geral do Fórum
Permanente de Segurança Pública do Estado de São Paulo
(FPSP/MAS/NCST-SP). Coordenador de Projetos do Centro de Estudos
Avançado em Problemas Sociais (CEAPS-SP). Membro Associado ao Instituto
Brasileiro de Ciências Criminais - (IBCCRIM). Membro da Associação
Internacional de Polícia (IPA/SP). Coordenador Acadêmico da Escola de
Formação de Comandantes de Guardas Municipais e Gestores de Segurança
Pública Municipal do CESDH/SP. Diretor Adjunto de Assuntos de Segurança
Pública e Direitos Humanos do Escritório Pereira Leutério Advogados
Associados. E-mail: professor.joaoalexandre@hotmail.com
Texto enviado pelo Prof. João Alexandre Santos